Alergia alimentar e reação alérgica

Este parece ser um problema que vem crescendo nos últimos anos entre as crianças porém, não são poucas as variedades de alimentos que encontramos nos supermercados, para atender a esse público. Se lembrarmos da nossa época de criança, quase não víamos frases do tipo, “livre de lactose”, “não contém glúten”, “leite de soja”, “leite de arroz”, e por aí vai. Hoje em dia temos muitas variedades para prevenir os sintomas das intolerâncias alimentares.

Segundo dados epidemiológicos do Consenso Brasileiro sobre Alergia Alimentar de 2007, a alergia alimentar é mais comum em crianças. Estima-se que a prevalência seja aproximadamente de 6% em menores de três anos e de 3,5% em adultos e estes valores parecem estar aumentando.

A prevalência é maior em pessoas com problemas na pele, como a dermatite atópica, porém algumas crianças asmáticas, também podem ter essa manifestação devido às alergias alimentares.

A alergia alimentar por leite de vaca, ovo, trigo e soja desaparecem, geralmente, na infância ao contrário da alergia a amendoim, nozes e frutos do mar que podem ser mais duradouras e algumas vezes durar por toda a vida.

Compreendendo as diferenças entre alergia x intolerância:
As reações graves e fatais podem ocorrer em qualquer idade, mesmo na primeira exposição conhecida ao alimento, mas os indivíduos mais susceptíveis parecem ser adolescentes e adultos jovens com asma e alergia previamente conhecida ao amendoim, nozes ou frutos do mar.

Podemos perceber também, que os termos alergia e intolerância causam grande confusão na maioria das pessoas, conforme a explicação da alergologista do Hospital Israelita Albert Einstein ao Jornal Estadão, Renata Rodrigues Cocco:
“Apesar de alguns sintomas serem parecidos, outros são totalmente diferentes. As alergias apresentam sintomas que variam desde erupções cutâneas até problemas mais sérios como as anafilaxias (acometimento de múltiplos órgãos, com ou sem queda da pressão arterial e falta de ar, quadros potencialmente fatais. Já nas intolerâncias alimentares, os sintomas são mais relacionados ao trato gastrointestinal, com transtornos na digestão do alimento”.

De um modo geral a principal diferença entre alergia e intolerância está na resposta que o organismo apresenta quando entra em contato com determinado alimento.
Alergia Alimentar: Nas alergias alimentares, o organismo interpreta que alguma proteína daquele alimento é um corpo estranho, e passa a produzir algumas reações que envolvem o sistema imunológico, por isso os sintomas são generalizados.

Intolerância alimentar: O organismo não possui determinada enzima para digerir alguma parte do alimento, logo o alimento não é digerido corretamente, o que poderá causar sintomas no trato gastrointestinal principalmente.
Foi observado que a maioria dos alimentos que causam intolerância alimentar nas pessoas são a lactose, o glúten, crustáceos, chocolates e alimentos com certos conservantes e corantes.

Fatores de risco para alergia alimentar:
– Características genéticas
– Imaturidade do sistema imune de mucosas
– Introdução precoce de alimentos sólidos antes de 4 meses
– Falha nos mecanismos de defesa do trato gastrointestinal
– Interações inadequadas com a flora comensal
– Alterações imunológicas
– Infecções gastrintestinais

Além destas características descritas na literatura há outras situações que podem influenciar o desenvolvimento da alergia, como descreve a nutricionista Karine Durães, de São Paulo, especializada em pediatria e fitoterapia, em uma reportagem do Geração Mãe:
“Temos muito mais conhecimento para diagnosticar hoje em dia, do que há alguns anos, quando o diagnóstico não era realizado. Por outro lado, também há muito mais ‘coisas’ no mundo moderno que fazem aumentar essa incapacidade do sistema imune de lidar de uma forma normal com algumas substâncias. São três coisas principais:

Uma delas é a teoria da higiene, quanto mais a gente fica deixando tudo limpo, usando sabonetes que matam bactérias, usando álcool gel, etc, mais o nosso organismo responde de uma forma exagerada para algum tipo de bactéria à qual ele não está acostumado.

As outras duas teorias são: um bebê que nasce de cesárea (aumentou muito o número nas últimas décadas), o primeiro contato da flora intestinal dele é com a flora hospitalar, que não é a melhor possível. Quando o bebê nasce de parto normal, passando pelo canal vaginal, o intestino dele se contamina com a flora da mãe, que é muito mais saudável. Essa flora deixa o intestino muito mais saudável para poder lidar com algum tipo de antígeno, e a criança acaba tendo menos chances de ter alergia ao leite de vaca.

O outro motivo é esse consumo de leite não adequado para uma criança muito pequena. A criança está na maternidade, acaba tomando uma fórmula infantil e aí o corpo dessa criança acaba tendo contato com esse tipo de proteína, muito diferente do que deveria ser e acaba reagindo por conta desse contato muito cedo.”

Diagnóstico da alergia alimentar:
A avaliação médica com coleta de história clínica e exame físico dará início à investigação, e poderá ser complementada por:
– Testes cutâneos
– Dosagem de anticorpos específica
– Dieta de exclusão
– Testes de provocação oral
– Endoscopia e biópsia

Manifestações da alergia alimentar:
As manifestações cutâneas (pele) como vermelhidão, pápulas, coceira, e o angioedema (inchaço em pálpebras, lábios, língua, bolsa escrotal, mãos e pés), e gastrointestinais como vômitos, diarreia e dor abdominal são as mais frequentes.

Sintomas respiratórios também poderão ocorrer como chiado, tosse, falta de ar, porém é importante compreender que esses sintomas respiratórios são comuns na infância, no entanto na manifestação da alergia alimentar esses sintomas respiratório não são isolados, mas acompanhados de outras manifestações como cutâneas e gastrointestinais.

Tratamento da alergia alimentar:
Tratamento ambulatorial:

Uma vez estabelecido o diagnóstico de alergia alimentar, a única terapia comprovadamente eficaz é a exclusão dietética do alérgeno implicado nas manifestações clínicas. (SBP, 2007)

Também são medidas importantes:
– Conscientização do paciente e família
– Educação/ informação
– Alternativas de substituição
– Manutenção das necessidades nutricionais
– Manutenção da qualidade de vida
– Acompanhamento médico e de um nutricionista

Tratamento de emergência:
Segundo o Consenso Brasileiro de Alergia Alimentar elaborado em conjunto com Sociedade Brasileira de Pediatria e Associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia (2007), o atendimento da emergência deve ser pautado em:
– Interrupção do alimento envolvido
– Alívio do sintoma desencadeado

Casos mais graves deverão ser mantidos sob observação contínua até o alívio dos sintomas, em contrário deverão ser hospitalizados.

Alergia alimentar e reação alérgica, o que a escola pode fazer?
A criança com necessidade alimentar especial tem o direito a ser acolhida no ambiente escolar com uma alimentação adequada às suas necessidades, assegurada pela Lei no. 12.982/14 e Lei 11.947/09.

Por isso é importante que a escola promova ações com objetivo de garantir a oferta de um cardápio especial para as crianças com alergia alimentar.

Confira abaixo as recomendações:

• Solicitar informações sobre alergia e intolerância das crianças no ato da matrícula;

• Informar ao professor responsável sobre o histórico desta criança;

• Orientar a equipe de nutrição para que possam ajustar o cardápio;

• Não confiar apenas nos rótulos dos alimentos, se for necessário entrar em contato pelo SAC do fabricante;

• Solicite aos familiares uma listagem com os materiais e fabricantes que costumam utilizar;

• Produtos de higiene e cosméticos também poderão conter alérgenos, por isso é importante não compartilhar produtos e conversar com os pais para compreender quais produtos podem ser utilizados;

• Realizar atividades educativas sobre o tema, especialmente com turmas que possuem alunos alérgicos é uma importante estratégia para prevenção, já que alimentos poderão ser compartilhados, além de favorecer a integração e cooperação;

• Não isolar a criança durante as refeições ou atividades que envolvam alimentos, isso poderá comprometer as relações entre elas;

• Separar a esponja e utensílios que serão utilizados no preparo dos alimentos oferecidos às crianças mais sensíveis;

• Evite o uso de frases que possam rotular a criança ou assustem as outras crianças (por exemplo: você não pode porque é alérgico);

• Estimular a lavagem das mãos e higiene do rosto de todas as crianças após o lanche e providenciar limpeza adequada da sala de lanche são atitudes importantes para evitar as reações de contato (especialmente se após o lanche forem utilizar o parquinho);

• Durante festas e comemorações estar atento para troca e compartilhamento de lanches, se ocorrer comunicar os pais para supervisão de possíveis reações;

• Comunicar os pais com antecedência sobre a ocorrência da festa, se possível disponibilizar produtos que possam ser consumidos pela criança com sensibilidade;

• Atentar para entrega de lembrancinhas contendo alimentos.

Se uma reação alérgica ocorrer na escola o que precisa ser feito?
A primeira recomendação é reconhecer os sinais e sintomas desta reação, é importante que todos os colaboradores a unidade escolar saibam quais são as crianças com sensibilidade a determinados alimentos e possam identificar rapidamente quando uma reação ocorrer.

Quanto antes a manifestação da reação alérgica for identificada, mais rápido será o atendimento evitando possíveis complicações.

Sintomas que poderão ser observados:
Vermelhidão e coceira pelo corpo: Ao observar que a criança está coçando determinada região do corpo, desconfiar de uma possível reação, leva-la a um local reservado e pedir para que levante a blusa, é muito comum que manchas vermelhas comecem pelo corpo e depois apareçam no rosto, por isso é importante identifica-las o quanto antes.

Olhos e lábios inchados: Desconfie da criança que apresentar coceira nos olhos, lacrimejamento e inchaço nas pálpebras, observe também os lábios, mãos e pés que poderão apresentar inchaço

Chiado, ronquidão e tosse: Se não há um quadro respiratório prévio (criança com resfriado por exemplo), a presença de chiado, ronquidão e tosse acompanhada de manifestações cutâneas e gastrointestinais poderão indicar uma reação alérgica.
Estar atento a esses sintomas, pois a dificuldade respiratória poderá ocorrer e até parada respiratória, o que representa gravidade do quadro.

Vômitos, diarreia e dor abdominal: A criança poderá apresentar vômitos, dores na barriga e até diarreia, desconfiar destes sintomas como parte da reação.

Após identificar os sintomas da reação alérgica o que pode ser feito?
Comunicar os familiares da criança imediatamente, eles são as pessoas mais indicadas para orientar os educadores sobre o que deve ser feito.

Na impossibilidade de falar com os familiares, verificar se a criança possui indicação médica de algum medicamento em caso de reação. Se possui, essa medicação deverá conter em receita médica legível, devidamente acompanhada da embalagem do medicamento e de um documento assinado pelos pais com as orientações para seu uso e para identificar os itens abaixo:
– Nome do aluno
– Nome do medicamento
– Dose para ser administrada pela via oral
– Nome e conselho do médico
– Atenção: o medicamento só poderá ser administrado se estiver acompanhado de receita médica

Uso da adrenalina autoinjetável em casos de reação alérgica:
Algumas crianças possuem reações mais severas, por esse motivo poderão ter indicação médica de adrenalina injetável.

Isso é necessário pois a reação poderá evoluir rapidamente causando risco de morte. Uma solução para esse tipo de situação é a utilização da adrenalina autoinjetável. Esse tipo de medicamento terá ação cerca de 8 minutos após ser aplicado na via intramuscular interrompendo o processo de anafilaxia.

Porém este medicamento na sua apresentação autoinjetável não é fabricado no Brasil. Por esse motivo a Sociedade Brasileira de Pediatria, por meio do Departamento de Alergia e Imunologia, entregou em 27 de janeiro um abaixo-assinado com seis mil assinaturas solicitando a disponibilização imediata da adrenalina autoinjetável para pacientes que necessitam.

Esse documento foi entregue coordenação da Área Técnica de Saúde da Criança e Aleitamento Materno do Ministério da Saúde em Brasília.

A Sociedade Brasileira de Pediatria será responsável por uma pesquisa em relação ao custo do medicamento em outros países, já que no Brasil não há nenhum laboratório que comercialize.

Para crianças que possuem essa receita médica, a alternativa é a aquisição da adrenalina autoinjetável pelos pais em outros países.

Se a escola receber a adrenalina autoinjetável e sua receita médica deverá utiliza-la conforme as orientações dos familiares (esses possuem a orientação médica de quando e como utilizar), confira abaixo as recomendações:
– Armazenar o medicamento dentro de sua embalagem original, com receita médica e fora do alcance de crianças, em recipiente protegido com tampa, preferencialmente em local de fácil acesso.
Após a aplicação do medicamento a criança deverá ser encaminhada para o hospital.

Referências:
BRICKS, L. F. Reações Adversas aos Alimentos na Infância: Intolerância e Alergia Alimentar – Atualização. Pediatria (São Paulo), 16(4): 176-185, 1994.
PEREIRA, A. C. S., et al. Alergia alimentar: sistema imunológico e principais alimentos envolvidos. Semina: Ciências Biológicas e da Saúde, Londrina, v. 29(2): p. 189-200, jul./dez. 2008.
PROTESTE; PÕE NO RÓTULO. Cartilha de Alergia Alimentar, Proteste e Põe no Rótulo, São Paulo, 2014.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA. Alergia alimentar, abordagem prática. Departamento de Alergia e Imunologia da Sociedade Brasileira de Pediatria, 2011.
Sociedade Brasileira de Pediatria e Associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia. Consenso Brasileiro sobre Alergia Alimentar: 2007, SBP; ASBAI, 2007.
BRASIL, Lei no. 12.982, DE 28 DE MAIO DE 2014, altera a Lei nº 11.947, de 16 de junho de 2009, para determinar o provimento de alimentação escolar adequada aos alunos portadores de estado ou de condição de saúde específica. Brasília, 2014.

 

Imagem ilustrativa: freerangestock.com